We Are Not Free - Traci Chee

 Passei meses sem escrever e também não lendo como gostaria. Ter priorizado alguns projetos pessoais e minha vida acadêmica, para ser honesta, não foram os únicos motivos para isso. Sempre coloquei minha saúde mental no topo das minhas prioridades e eu ainda estava/estou tentando seguir em frente. Esse ano conseguiu me quebrar em pedaços que ainda estou tentando recolher e, alguns, acho que nunca irei achar novamente. Consegui construir outros novos, mais fortes (e tenho orgulho disso), mas passei a acreditar que alguns dos vazios que permaneceram são necessários também. 

Consolar minha mãe depois da cirurgia dela me trouxe uma onda de sentimentos que não sou capaz de descrever ou entender ainda. Eu queria conseguir fazer esse texto sem precisar mencionar como estou, mas esse blog não seria esse blog de outro jeito, I guess. 

Fiquei semanas tentando arranjar frases decentes para falar de We Are Not Free, da Traci Chee, mas minha exaustão com tudo ficava me atrapalhando. Esse foi um dos livros mais singelos e especiais, e não merecia uma resenha apressada (ela demorou meses? demorou, mas tá aqui kkkkkkkk). 

Crescer como uma criança amarela em um país que tem muitos preconceitos raciais e étnicos, apesar da imagem principal de que não, foi um processo longo de busca pela minha identidade. Uma pergunta que marcou a Ana de 4, 5 anos, veio da mãe de um amigo do jardim de infância. Eu tinha duas amigas naquela escola que também tinham ascendência japonesa e essa mãe perguntou pra mim: "vocês são primas ou irmãs?" 

Naquela época eu tinha ficado confusa com aquilo, mas não foi a última vez que fizeram perguntas parecidas. Crescer com suposições de estranhos sobre quem você é, ou ser imediatamente colocada em caixas pela sua herança genética, é algo que pode parecer inofensivo para outros, mas na realidade não é. 

O preconceito e o racismo contra a comunidade asiática não era um assunto muito debatido (a não ser na maioria por pessoas amarelas) porém, por conta dos crimes de ódio que intensificaram com a pandemia, o movimento Stop Asian Hate acabou ganhando mais destaque na mídia. 

We Are Not Free é uma ficção que aborda o encarceramento de nipo-americanos durante a Segunda Guerra Mundial e mostra como as raízes das discriminações contra a comunidade asiática não são algo recente.


Sinopse

Quatorze adolescentes que cresceram juntos em Japantown, San Francisco.

Quatorze adolescentes que formam uma comunidade e uma família, tão interligados quanto conflituosos.

Quatorze adolescentes cujas vidas são viradas de cabeça para baixo quando mais de 100.000 pessoas de ascendência japonesa são removidas de suas casas e forçadas a campos de encarceramento desolados.

Em um mundo que parece determinado a odiá-los, esses jovens nisei devem se unir enquanto o racismo e a injustiça ameaçam separá-los.


Traci Chee trouxe 14 pontos de vista que trazem a pluralidade de cada um desses jovens, mostrando para os leitores que não, não somos todos iguais ou mesmo parecidos. Cada um dos personagens tinha sonhos e aspirações diferentes, cada um com seus maneirismos e peculiaridades. 

O sentimento de não conseguir se sentir pertencente foi algo com o qual, definitivamente, consegui me identificar. O limbo de ter nascido em um país que tem uma percepção de que você é estrangeira e de ser automaticamente atrelada uma nação que você nunca conheceu pessoalmente. Crescer com esse limbo é confuso, para dizer o mínimo. 

Passei por diversas fases, eu diria. De vergonha, negação, raiva. Eram sentimentos muito fortes na minha transição para adolescência. Ser parte de uma minoria é um processo constante de autoaceitação (ou, infelizmente, em muitos casos, não).                                 

A autora incluiu fotos, e também ilustrações, em uma das edições mais lindas que já vi. Ela recontou, por meio dessa ficção, pedaços do que os familiares dela vivenciaram. O que essas milhares de pessoas vivenciaram, sendo privadas de suas liberdades e direitos. Sendo vítimas de racismo e injustiça, estes que, mesmo décadas depois, em outro século, continuam a ocorrer de diversas maneiras. Assim como a Traci, acredito que a história, o passado, não podem ser esquecidos, porque fazem parte de quem somos como humanidade, como indivíduos.   

                            



Eu marquei esse livro com tantos post-its que quase destaquei ele por completo. Vou deixar alguns dos trechos que mais me tocaram, apesar de querer colocar todos eles aqui. 


"Eles nem conseguem usar a palavra cidadão para nós nisei, conseguem?" 


"Em janeiro de 1942, eu fui seguido de volta ao Chevy, ao seu Chevy, por quatro homens caucasianos, que me disseram que Nips não eram desejados na vizinhança deles. Eu observei metade de Japantown na calçada com suas bagagens, com todas as coisas que eles deixaram no mundo, enquanto soldados armados os conduziam para ônibus para serem despachados das únicas casas que eles já conheceram."


"Você sabia que eles têm bebedouros separados aqui para brancos ou pessoas de cor? Entradas separadas, seções de assentos separadas, nada igual? No Japão, você sabia, quando sonhava com a América, que ela nunca era igual?"


"Eu não consigo não sentir essa eletricidade dentro de mim. Eu não consigo não ficar machucado e não ficar bravo e não querer arrancar coisas das paredes."


"E eu compreendo, finalmente. Gaman.

 A habilidade de segurar sua dor e amargura dentro de você e não deixar elas te destruirem. Fazer algo lindo através da sua raiva, ou com sua raiva, e não apagá-la ou deixá-la te definir. Sofrer. E se enfurecer. E perseverar."



p.s.: sim, a base desse texto foi escrita ano passado e só agora resolvi terminá-lo e postá-lo aqui. não editei o começo, colocando-o no presente, porque eram palavras que eu precisava escrever e manter elas parecia ser o mais justo comigo. 


"Same, the breaths we breathe

Same, the dreams we dream

Same, laughter and tears in life

Same, all things to be respected


Just a piece to give strength

In the puzzle of our hearts"


- (= Equal Sign), j-hope


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